quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

De Pagu a Patrícia, o último ato


Por Maria Inês Prado    

12 de dezembro de 2012: cinquentenário da morte da sanjoanense Patricia Rehder Galvão, mulher plural, como a define seu filho Geraldo Galvão Ferraz, na introdução de Paixão Pagu, a autobiografia precoce de Patrícia Galvão, Agir Editora, 2005.

Muito embora a morte seja um mistério indecifrável, todos nós temos alguns conceitos alinhavados a respeito da única certeza da vida. Pessoalmente, creio que a matéria se finda, mas o espírito permanece, refletindo-se nas marcas legadas à posteridade. 

Nesse sentido, as marcas que Pagu nos deixou não esmaeceram com o passar dos anos; ao contrário, esmiuçadas pelos estudiosos, aprofundam-se mais e mais. Dona de personalidade singular, Pagu, a inquieta, inconformada, idealista, ativista, artista multifacetada, mulher e mãe amorável, instiga os intelectuais até hoje, ensejando polêmicas e obras notáveis, tanto no Brasil como no estrangeiro, v.g., Estados Unidos.
Aqui, Augusto de Campos reavivou-a no trabalho primoroso Pagu, vida-obra (Brasiliense, 1982).  Outros amantes da musa redescobriram o caminho percorrido por ela, iniciado sob a serra da Mantiqueira e concluído sob as aragens do mar santista. Lúcia Maria Teixeira Furlani, da Unisanta, publicou  Pagu - Patricia Galvão, livre na imaginação e no tempo (Ed, Unisanta, 1999) e Viva Pagu, fotobiografia de Patricia Galvão, em parceria com Geraldo Galvão Ferraz  (Unisanta e Imprensa Oficial, 2010). Pagu inspirou documentários, seriados, peças teatrais e música.  Em 2010, a EPTV – Central realizou a série Pagu da Serra ao Mar, com reportagens abrangentes, focando o berço de Pagu, o histórico familiar, através de depoimentos de fãs e amigos, tanto em São João da Boa Vista como em Santos, onde o oceano lhe aplacava a alma.

Nos Estados Unidos, K. David Jackson, professor da Universidade de Yale, especialista em literatura portuguesa e estudioso ferrenho do legado de Pagu, verteu para o inglês a ousada obra de Patrícia Galvão, Parque Industrial, publicado em 1933, sob o pseudônimo de Mara Lobo. Industrial Park, editado pela University of Nebraska Press, em 1993, tem observações valiosas no seu prefácio, parte do qual traduzo:

[...] Desde a primeira leitura nós tivemos a certeza de que desejávamos traduzir o romance de Pagu, e a cada releitura nós o achávamos mais original e fascinante. Foi uma descoberta extraordinária em muitos aspectos. Primeiro de tudo, era um trabalho de Pagu, precoce e desconhecido, quando ela era uma jovem militante ainda associada a Oswald de Andrade. Estilisticamente, ela inovou nos anos em que muitos escritores combinavam a experiência modernista com temas do realismo social. Sua abordagem sobre raça e classe comparava-se favoravelmente com  romances proletários de Jorge Amado, do mesmo período, mas acrescentava perspectiva feminina valiosa sobre o meio urbano que não havia sido avaliado antes.

Cenas de cunho anarquista e propaganda comunista demonstravam o quanto Pagu estava envolvida em promover conscientização e revolução política dos trabalhadores. Seu romance nos impressionou por denunciar as falhas do início da industrialização,  através de histórias pessoais de mulheres, e por sua ousadia em  apontar casos de abuso de trabalhadoras, confrontos políticos e exploração sexual, além de outros. Pagu escreveu a partir de suas próprias experiências e ponto de vista, formados no distrito de trabalhadores imigrantes, onde viveu, e junto à elite social que ela frequentava com Oswald. [...]

Agora, marcando o cinquentenário da morte de PAT, a talentosa Márcia Costa, premiada no Concurso Pagu, cem anos de história (Academia de Letras de São João da Boa Vista), lança, através da Dobra Editorial,  De Pagu a Patrícia – o último ato: em 5/12,  na Casa das Rosas, São Paulo, e em 8/12, na Pinacoteca Benedito Calixto, Santos. Aplausos para essa estudiosa que extrai seiva dos meandros de Pagu!

Patricia Galvão deu ao mundo seu recado. Cabe-nos interpretá-lo e pô-lo em prática.

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